terça-feira, 14 de fevereiro de 2006

Não sou poeta

Recordo, sorrindo, o frio.
Apesar da geada que hoje pintou de cristal fosco os vidros,
Eu sei que o frio, o nosso, é passado.
Sorrio, que mais, porque não preciso já da tua recordação,
Da recordação da tua paixão,
Para perder o frio.
Estiveste comigo esta noite,
Esquecendo o frio, o teu e o meu,
Como em tantas outras noites, todas.
E espanto-me ao olhar para ti, conhecendo-te de cor,
E vendo a cada olhar uma surpresa
Que me recorda o quanto te quero, todas, todas as noites.
Poderia haver a melancolia,
Tendo-te aqui todas as noites,
De te reconhecer sempre do mesmo modo.
Poderia até haver o enfado,
Tendo-te em mim todas as noites,
De uma triste monotonia.
E por isso me espanto,
Por não precisar da tua recordação para deixar de ter frio.
Por me bastares tu, aqui, todas, todas as noites,
Uma paixão presente ao invés de prometida,
Uma história vivida, muito mais que imaginada.
E se a paixão inflamada do poeta precisa do frio para sobreviver,
Da distância para estar mais perto,
A nós basta-nos estar, todas, todas as noites,
Juntos.
Por não ser poesia não sofrer,
Não sou poeta.
Amo.