terça-feira, 17 de março de 2009

12 anos

Muitas imagens surgem na minha cabeça quando penso nos meus 12 anos. Muitas outras surgirão na cabeças de quem está aí, do outro lado do ecrã. Cada um teve a sua infância, mas certamente todos se recordarão da imaturidade que tinham aos 12 anos, da inocência maior ou menor. Mas de ser, aos 12 anos, criança. Talvez, também, uns mais e uns menos.
A Raquel tinha 12 anos. Vinha à Urgência porque os pais não se conseguiram lembrar de sítio melhor. O nível socio-económico era visivelmente baixo, o que terá certamente potenciado os eventos que culminaram com aquela ida à Urgência. A Raquel tinha fugido de casa dois dias antes, contava-me a mãe. A Polícia tinha-a encontrado com duas amigas e com alguns rapazes, nem percebi onde e em que circunstâncias. E, devolvida à família, não sabiam o que fazer. Assim contava a mãe. Naturalmente perguntei o que pretendiam então de mim... Disse-me a mãe, corada como um tomate, "é que ela... coiso!". Percebi que precisava da colaboração da Raquel, e portanto disfarcei a surpresa com uma pergunta "a Raquel teve relações sexuais, é assim?". A mãe anuiu, aliviada por lhe ter obviado a vergonha de não o saber dizer eufemisticamente. Pretendia que lhe fosse realizado um exame ginecológico, mas a Raquel garantia veementemente que as relações tinham sido consentidas. Não havia indicação para tal, mas algumas coisas precisavam ser apuradas... A Raquel não queria falar perante a mãe, e portanto pedi-lhe que saísse por um pouco. Explica-me então a Raquel, com os seus 12 maduros anos, que tinha tido já várias relações, sempre sem penetração e com preservativo. Expliquei-lhe que mesmo sem penetração a gravidez é possível, o que a fez mudar de cor... Talvez o preservativo não estivesse colocado todo o tempo, confessou. Desta vez tinha fugido, com o mesmo namorado. Na noite em que fugiram tiveram relações, consentidas - garantiu-me -, mas temia que o preservativo se tivesse rompido. Assim aguardámos o teste de gravidez, negativo, para podermos dar a pílula do dia seguinte. A uma menina de 12 anos. O pai, divorciado das mãe e emigrado na Suiça, tinha voado para Portugal pela notícia de desaparecimento da filha. A decisão estava tomada entre pai e mãe, ela ia viver na semana seguinte para a Suiça. Perdida a inocência, com a esperança de a recuperar noutras paragens. Mas com pouca fé.