terça-feira, 5 de julho de 2005

Pediatria

Comecei esta semana um novo estágio. Acabei o estágio de Cirurgia Geral, e iniciei o de Pediatria. Gosto muito de Pediatria (especialidade que aliás considero como uma opção a ponderar seriamente), mas Pediatria é uma especialidade muito complexa. Não se trata apenas de ver bebés bonitos e putos reguilas... A doença é, na criança, um evento terrível. Custa muito lidar com crianças doentes, especialmente quando estão doentes a sério. Não se trata apenas de ranhocas e vómitos (essa é a parte fácil), mas vê-los verdadeiramente doentes, a sofrer, não é para qualquer um. Será para mim? Não sei. O tempo o dirá.

O João é um miúdo muito bem disposto. Tem 10 anos, e veio hoje à Consulta de Pediatria do Hospital. Sorriu bastante ao longo da consulta, apercebe-se muito bem de tudo o que o rodeia. A avó, que cuida dele, é uma pessoa extremamente dedicada. Percebe-se, pela higiene e condição física do João. Conta-nos que (e não podemos deixar de sorrir destas pequenas coisas) o João se dá muito bem na escolinha dos "deficientes a motor". Tem aprendido, com a ajuda preciosa de um computador especial, muita coisa. Está no 5º ano de escolaridade, graças a esse computador. Apesar de todas as suas dificuldades, e o seu défice motor poderia ter comprometido seriamente a sua aprendizagem, conserva no interior daquele corpo deformado uma mente lúcida e brincalhona. Sorri de lado, com ar malandro, quando a avó conta que as "meninas lá da escola" se derretem todas com ele. O João tem Paralisia Cerebral. Trata-se de uma situação cujas causas nem sempre são aparentes, e podem ser diversas. No caso do João, compreende-se bem o que levou à sua situação. A mãe, toxicodependente heroinómana, consumiu drogas durante a gravidez. Isto levou a um atraso de crescimento intra-uterino e a outras complicações que, no final, resultaram na sua Paralisia Cerebral. Vale-lhe a avó. E entretanto vai crescendo, ajudado por homens e máquinas. Só se desvanece o seu sorriso quando a avó se pergunta, em voz alta, o que será dele quando ela morrer. Conta-nos ainda que o João encontrou a sua solução: irá com ela. Brincamos, dizendo que não é bem o mesmo que apanhar o autocarro... Mas o que o futuro trará para o João é incerto... No entretanto, vale-lhe a avó. E muito bem.