Há algum tempo, estagiava eu num serviço de Ginecologia e Obstetrícia, passou-me pelas mãos um caso "daqueles"... Daqueles que todos desejávamos que fossem menos frequentes...
Estava no Serviço de Urgência de Gin-Obst quando chegou uma ficha de uma rapariga de 13 anos. Vinha com a mãe, e vinha absolutamente em pânico. Chorava copiosamente e a mãe trazia um olhar carregado. A mãe contou a história por ela: ela tinha chegado a casa essa tarde e sangrava abundantemente da vagina. Tinha engravidado havia algum tempo, confessou-nos, mas tinha escondido essa gravidez dos pais durante todo esse tempo. Nessa tarde tinha ido a uma "clínica" clandestina onde faziam abortos. Tinham-lhe perguntado de quantos meses era a gravidez, ou seja, há quanto tempo tinha tido a última menstruação. Ela tinha perdido sangue pela última vez 2,5 meses antes. Como tal, na "clínica" deram-lhe comprimidos abortivos, remédio suficiente para 2,5 meses de gestação. E o resto da história já sabem, chegou a casa a sangrar abundantemente.
Fizemos a observação e uma ecografia, e tudo conferia à excepção de um ponto importantíssimo: o tempo de gestação. O feto tinha 5 meses de gestação, e não 2,5... Perguntada bem a história, tinha de facto tido uma pausa na menstruação, depois teve um sangramento há 2,5 meses e de então para cá nada mais.
5 meses é tempo demais para este método abortivo, e a rapariga não reagiu nada bem quando lhe explicaram que ia ter um parto e não um aborto... Demonstrou aliás a óbvia (e necessária, tinha 13 anos!!) falta de maturidade para estar envolvida naquela situação... Algumas horas de trabalho de parto depois a criança nasceu, para morrer breves instantes depois. Feliz ou infelizmente?...
Este é apenas um dos muitos casos que envolvem as clínicas clandestinas de aborto... Alguns acabam pior, com a morte das mães nos hospitais para onde correm após o aborto mal sucedido... Outros resultam em partos também, de crianças com malformações permanentes e gravíssimas...
Contra o aborto? Sou. Todos somos. Mas acima disso sou a favor do rigoroso aconselhamento familiar aliado à existência da possibilidade de realização de abortos em condições técnicas, científicas e sociais adequadas, nos hospitais.
Sintam-se à vontade para comentar! Este espaço também se pretende de discussão, e tenho a certeza que ninguém fica indiferente a este tema tão polémico.
domingo, 24 de outubro de 2004
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