Fiquem com Louis Armstrong - um clássico - e Dizzie Gillespie, que rompeu com os clássicos com o seu Bebop. Dizzie foi com Charlie Parker o fundador do movimento, tão mal-falado nos seus primórdios pela irregularidade e rapidez do ritmo e notas distónicas, quebrando a harmonia do Swing e das Big Bands. Neste vídeo, Louis Armstrong mostra a sua enorme versatilidade ao aproximar-se do movimento radical que levou o Jazz para fora dos seus limites. Uma combinação deliciosa; a aceitação de um futuro divergente e fracturante por parte de um grande mestre.
E, para os que não gostam de Jazz: vejam na mesma o vídeo. As bochechas do Dizzie merecem ser vistas. São a razão para que qualquer aluno de sopro oiça: "Pára de encher as bochechas! Ainda ficas como o Gillespie!".
domingo, 29 de março de 2009
terça-feira, 17 de março de 2009
12 anos
Muitas imagens surgem na minha cabeça quando penso nos meus 12 anos. Muitas outras surgirão na cabeças de quem está aí, do outro lado do ecrã. Cada um teve a sua infância, mas certamente todos se recordarão da imaturidade que tinham aos 12 anos, da inocência maior ou menor. Mas de ser, aos 12 anos, criança. Talvez, também, uns mais e uns menos.
A Raquel tinha 12 anos. Vinha à Urgência porque os pais não se conseguiram lembrar de sítio melhor. O nível socio-económico era visivelmente baixo, o que terá certamente potenciado os eventos que culminaram com aquela ida à Urgência. A Raquel tinha fugido de casa dois dias antes, contava-me a mãe. A Polícia tinha-a encontrado com duas amigas e com alguns rapazes, nem percebi onde e em que circunstâncias. E, devolvida à família, não sabiam o que fazer. Assim contava a mãe. Naturalmente perguntei o que pretendiam então de mim... Disse-me a mãe, corada como um tomate, "é que ela... coiso!". Percebi que precisava da colaboração da Raquel, e portanto disfarcei a surpresa com uma pergunta "a Raquel teve relações sexuais, é assim?". A mãe anuiu, aliviada por lhe ter obviado a vergonha de não o saber dizer eufemisticamente. Pretendia que lhe fosse realizado um exame ginecológico, mas a Raquel garantia veementemente que as relações tinham sido consentidas. Não havia indicação para tal, mas algumas coisas precisavam ser apuradas... A Raquel não queria falar perante a mãe, e portanto pedi-lhe que saísse por um pouco. Explica-me então a Raquel, com os seus 12 maduros anos, que tinha tido já várias relações, sempre sem penetração e com preservativo. Expliquei-lhe que mesmo sem penetração a gravidez é possível, o que a fez mudar de cor... Talvez o preservativo não estivesse colocado todo o tempo, confessou. Desta vez tinha fugido, com o mesmo namorado. Na noite em que fugiram tiveram relações, consentidas - garantiu-me -, mas temia que o preservativo se tivesse rompido. Assim aguardámos o teste de gravidez, negativo, para podermos dar a pílula do dia seguinte. A uma menina de 12 anos. O pai, divorciado das mãe e emigrado na Suiça, tinha voado para Portugal pela notícia de desaparecimento da filha. A decisão estava tomada entre pai e mãe, ela ia viver na semana seguinte para a Suiça. Perdida a inocência, com a esperança de a recuperar noutras paragens. Mas com pouca fé.
A Raquel tinha 12 anos. Vinha à Urgência porque os pais não se conseguiram lembrar de sítio melhor. O nível socio-económico era visivelmente baixo, o que terá certamente potenciado os eventos que culminaram com aquela ida à Urgência. A Raquel tinha fugido de casa dois dias antes, contava-me a mãe. A Polícia tinha-a encontrado com duas amigas e com alguns rapazes, nem percebi onde e em que circunstâncias. E, devolvida à família, não sabiam o que fazer. Assim contava a mãe. Naturalmente perguntei o que pretendiam então de mim... Disse-me a mãe, corada como um tomate, "é que ela... coiso!". Percebi que precisava da colaboração da Raquel, e portanto disfarcei a surpresa com uma pergunta "a Raquel teve relações sexuais, é assim?". A mãe anuiu, aliviada por lhe ter obviado a vergonha de não o saber dizer eufemisticamente. Pretendia que lhe fosse realizado um exame ginecológico, mas a Raquel garantia veementemente que as relações tinham sido consentidas. Não havia indicação para tal, mas algumas coisas precisavam ser apuradas... A Raquel não queria falar perante a mãe, e portanto pedi-lhe que saísse por um pouco. Explica-me então a Raquel, com os seus 12 maduros anos, que tinha tido já várias relações, sempre sem penetração e com preservativo. Expliquei-lhe que mesmo sem penetração a gravidez é possível, o que a fez mudar de cor... Talvez o preservativo não estivesse colocado todo o tempo, confessou. Desta vez tinha fugido, com o mesmo namorado. Na noite em que fugiram tiveram relações, consentidas - garantiu-me -, mas temia que o preservativo se tivesse rompido. Assim aguardámos o teste de gravidez, negativo, para podermos dar a pílula do dia seguinte. A uma menina de 12 anos. O pai, divorciado das mãe e emigrado na Suiça, tinha voado para Portugal pela notícia de desaparecimento da filha. A decisão estava tomada entre pai e mãe, ela ia viver na semana seguinte para a Suiça. Perdida a inocência, com a esperança de a recuperar noutras paragens. Mas com pouca fé.
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Hospital
domingo, 15 de março de 2009
Filipe Melo Trio
Um trio de Jazz em português, encabeçado pelo Filipe Melo, um jovem e um pouco excêntrico músico/cineasta. A parte do excêntrico vem como cineasta... Abaixo, o Jazz e a excentricidade!
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Every other sunday Jazz
domingo, 8 de março de 2009
Um salvamento diferente
Ponte 25 de Abril, Sábado à hora de almoço. Ia calmamente a caminho da margem sul do Tejo, quando vejo um grande alvoroço. Três carros encostados na faixa da direita, sete ou oito pessoas fora dos carros com um ar aflito, uma mulher nova a desmaiar - assim me pareceu. É nestas alturas que amaldiçoo ser médico - como quando no avião se ouve "há algum médico a bordo?". Estamos fora do nosso ambiente, sem o nosso material, em situações de risco, tudo pode acontecer. E pior, podemos não ser capazes de ajudar e a nossa ajuda demorar a chegar. Assim, com o coração aos saltos, encostei e vesti o colete. Saio do carro e pergunto: "Sou médico, precisam de um médico?". E aí a reacção estranha: uma série deles olham para mim, caras de estranheza, e um deles "De um médico? Não, ela quer-se atirar da ponte!". Ela estava a ser agarrada por dois homens - familiares, imaginei - que diziam "Não te vais nada atirar, vais é para dentro do carro!". A situação parecia controlada, e assim encaminhei-me para o carro. Ao entrar no meu carro, a mariamadalena ve-a entrar por uma porta do carro, forçada, e eu vejo-a sair disparada pela outra. Sem olhar sequer para os carros que faziam travagens bruscas à sua volta atravessou todo o tabuleiro da ponte até ao outro lado, começando a trepar as protecções. Nessa altura saio novamente do carro, um outro homem consegue agarra-la, e de repente somos três, que a agarram e imobilizam no chão, enquanto ela esperneia, dá pontapés e nos chama coisas do piorzinho que possam imaginar. Fico a sangrar do lábio, de um pontapé mais bem desferido, mas conseguimos finalmente imobiliza-la. Depois foi esperar que chegasse a polícia para a levar para o hospital mais próximo. Entretanto pouco conseguimos perceber das suas motivações, da sua vida... Nenhum dos presentes era seu familiar, eram todos desconhecidos que pararam em cima da ponte para a impedir de pôr fim à vida. Não tinha ali o carro, tinha vindo a pé pelo tabuleiro da ponte, e um verdadeiro herói parou o carro quando a viu trepar as protecções, salvando-lhe a vida. O outro, mais corajoso do que pensou ser, dizia-me entredentes "Porra que eu tenho vertigens, só estou aqui por ela", enquanto se sentava em cima dos joelhos dela. Finalmente chegou a polícia, primeiro uma mota sem recursos e depois os reforços para a levarem. E depois cada um seguiu o seu caminho, todos rezando para que alguém a possa verdadeiramente ajudar e fazer querer viver...
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Coisas
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