quinta-feira, 23 de dezembro de 2004

Lá terá que ser...

...um post de Natal.

O Natal é uma época complicada... Se por um lado muitas pessoas andam atarefadas com o extase do consumismo nacional, outras ainda vêm no Natal a festa da reunião da família. Enquanto algumas pessoas se enroscam em redor da lareira, outras enroscam-se nos lencóis frios dos hospitais. Alguns passam-no em casa, outros na casa dos pais e avós, outros ainda têm o azar de estar a trabalhar enquanto o filho abre os presentes: "Porque é que o pai não está cá, mãe?" "Está no hospital, filho, teve que ir trabalhar...".

No Natal os velhotes vêm às Urgências num número assustador. Todos eles trazidos pelos filhos, pelos motivos mais variados... Alguns simplesmente pretendem abandonar o "chato do velho" no hospital - não lhe custará concerteza encontrar sintomas que justifiquem alguns exames e umas horitas de observação e... ups! Acabados os exames e a observação e o filho já lá não está. Não há contactos, o velhote não sabe números de telefone nem tem telemóvel. E lá ficou ele, para passar o Natal. Doente? Está, está, nunca deixou de estar. E agora está mais um pouco. Apesar destes casos não serem NADA raros, ainda há outro caso: aqueles que não visitavam o velhote desde o Natal passado e, regressados "à terra", o encontram magro, doente, velho. E assim, assustados pela condição do velhote, levam-no ao hospital. Com a melhor das intenções, acredito, mas a ausência durante o ano anterior não foi se calhar muito positiva... Os desgraçados dos Médicos Internos, os mais novos (o eterno mexilhão), passa o 24 no Hospital. Que remédio, já sabemos que assim é... Os casos tristes da sociedade caem todos lá, é um dia deprimente. Se não for para serem abandonados, os velhotes vão lá porque estão sozinhos, e quem é que gosta de estar sozinho no Natal?... Contam histórias uns aos outros, entretêm-se uns aos outros e a nós...

Claro que há muito mais no Natal além disto. Há a família dos que a têm, reunida em torno da lareira (ou do aquecedor), a trocar prendas compradas com carinho. Há o Natal das crianças, mesmo as que não têm família têm no Natal uma festa. Em nenhuma outra altura do ano as pessoas se lembram tanto de ser solidárias e de ajudar o próximo como no Natal. E, por pouco que seja, muitas pessoas levam as pequenas alegrias do Natal aos que têm muito pouca alegria na vida... Mesmo no Hospital, alunos de Medicina e voluntários entregam pequenas lembranças embrulhadas aos doentes internados, levando-lhes também a eles um pouco do brilho do Natal.

Gosto do Natal, pelo que me traz de convívio com os que me são queridos, pelo brilho que acende um pouco por toda a parte. Não gosto de muito do que significa o Natal no presente, mas resta-me acreditar que as pequenas coisas, os pequenos gestos, podem levar um pouco de alegria a toda a gente. E por isso, a todos os que seguem estas minhas pequenas crónicas,

Um Feliz Natal!